quinta-feira, 19 de julho de 2007

Metalinguagem

Revirara seus baús, gavetas, pastas e armários em busca de algum lirismo. Não encontrara.
Precisava de versos livres, deixa-prende, redondilhas, alexandrinos; alguma coisa onde pudesse se expressar, mas não, não encontrava.
Resolveu ir ao banheiro, afinal, o banheiro é um ótimo clareador e formador de idéias. Dessa vez fora apenas dor de barriga, pura e simplesmente.
Falar de amor? Solidão? Política? Quem sabe escrever a letra de um tango! Um tango-político? Nenhuma das idéias eram totalmente convincentes, nítidas, inspiradoras. Os pensamentos eram difusos, voavam de um lado para o outro, talvez nem uma rede de apanhar borboletas resolveria, no intuito de capturar um ou outro pensamento, afim de organizá-los por cor, tamanho, prendê-los depois com alfinetes. Falar de cores, formas... Não, parecia psicodélico demais.
Tentou dormir. O sono seria um inseticida que mataria as borboletas. Mas afinal, borboletas morrem com inseticida? Tinha dúvidas a respeito, e então o sono não chegou.
Conforme a madrugada avançava, pior ficava a situação. Os pensamentos agora eram como aqueles pontinhos de luz que pairam no ar: irrequietos e cada vez menos coerentes. Será mesmo que esses pontinhos luminosos existem?
O barulho dos carros que ainda passavam àquela hora na rua, misturava-se ao cricrilar dos grilos. E havia alguma poética nisso? O barulho de um avião, de um caminhão... Ambos responsáveis pelos ruídos rimavam, mas eram nulos quando se tratava de inspiração.
Retomou a idéia do tango. Um tango precisa ser triste, melancólico, mas não, não se encontrava em nenhum desses estágios, nada de tristeza, nada de melancolia. A confusão de pensamentos era tamanha, que não havia espaço, nem tempo, nem concentração para que algum sentimento pudesse se manifestar.
Estava inerte, resolveu exercitar a paciência. Pensamentos arruaceiros! Uma hora cessariam. Olhava para o vazio, um vazio não tão vazio, o guarda-roupa à sua frente: seis portas, quatro gavetas. Gavetas essas sem nenhum lirismo interno. Cansou de impor a ordem e o progresso aos pensamentos; sempre quando algo é imposto, há revolta. Resolveu esperar um insight. Foram dez, quinze, vinte minutos, meia-hora e nada, os insights também pareciam bem preguiçosos na ocasião. Após tanta espera, sentiu dor nas costas e resolveu se deitar. Colocou seu caderninho e caneta no criado-mudo, juntamente com o copo d’água, caso sentisse sede. E se sentisse sede e inspiração ao mesmo tempo, melhor! Quem sabe até mesmo um sonho... E apagou o abajur.

5 comentários:

Anônimo disse...

A personagem estava sem inspiração porque não conheceu a escritora da crônica (géli) e não leu LFV !! ou então não é espectadora assídua do nosso blog !("merchandising"barato esse meu ahahah)...
Enfim,outra gostosa crônica ,enriquecendo nossa leitura e imaginação.Parabéns !

Anônimo disse...

Parabéns! Muito criativa!

Unknown disse...

Mas que preguiçosa, foi dormir e não escreveu nada, vc só dorme Maria Angélica!

Anônimo disse...

Mai é o furo falando do rasgado, o sujo do mal lavado, enfim!

Anônimo disse...

dzidzilo